Há poucos meses fiquei nua para um ensaio fotográfico. O meu pedido a Angela Rezé, a fotógrafa, foi: quero o meu corpo retratado e só. Não desejava a abordagem sensual porque, para mim, sensualidade cai melhor quando acompanhada de um par amoroso dentro de um quarto.
O meu objetivo era obter retratos do meu corpo no momento presente. Sem máscaras, sem filtro, sem esconder o que sou. Rejeito ilusões, pois o que se é segue existindo mesmo quando bem disfarçado.
Apesar dos sons ao redor, percebi apenas o silêncio. Éramos o meu nu frontal e o silêncio do eu.
A harmonia entre fotografada e fotógrafa anulou pudores, preconceitos ou constrangimentos, possibilitando o fluir do encontro que eu havia marcado comigo mesma. Sob o foco de lentes profissionais, tive a clara percepção da minha identidade corporal. A forma, a fisionomia e a energia que fazem com que me reconheçam pelo nome Ana.
Dias depois, com as fotos em mãos, tive a consciência de que não conhecia as minhas costas e seus contornos, assim como os meus cotovelos e suas dobras. Eu nunca tinha observado o atrás de mim e, o mais surpreendente, conhecer o atrás jamais fora questionado.
Nunca imaginamos, por exemplo, as sombras que as escápulas formam no meio das costas. E mesmo de frente, quando me vejo através do espelho, tenho apenas o reflexo, a imagem invertida. Se eu achava que me conhecia, estava enganada.
Descobri a decência do corpo descoberto. E é apenas um corpo dentre tantos outros.
O que sou é mais do que é este corpo. Quando ele perecer e desaparecer – a certeza de todos nós – creio que continuarei existindo em algum tempo, algum espaço. Enquanto isso, ele é o que me identifica e permite o meu estar no mundo físico. Essa experiência transcende o registro fotográfico, ultrapassa a aparência do corpo no movimento cotidiano da vida.
Sempre achei que, como forma de autoconhecimento, homens e mulheres deveriam passar pela experiência de viajar só, sem companhia. Acrescento o retratar-se isento de roupas num ensaio fotográfico como mais um meio de encontro consigo mesmo. São atos do descobrir-se e apossar-se do que se é. Definitivamente, há que se estar com a alma preparada para essa descoberta.
A nudez permanece mesmo em tempos de tantos desconfortos com relação ao corpo desnudado.
Oxalá eu nunca me perca do que sou mesmo quando enfeitada com etiquetas sociais, pois esta é a casa onde mora o eu. É o corpo que sustenta uma realidade.
Foto: Angela Rezé