A Distância Entre se Importar e Estar Pouco se Fodendo
Na semana passada foi o Dia Internacional da Mulher. Meu Twitter estava cheio de pessoas falando sobre diversidade, como ser melhores aliados e como melhor apoiar a presença de mais mulheres no universo da tecnologia.
Para muitos de nós, o Dia da Mulher é complicado. Por um lado, é refrescante ver várias pessoas falando sobre bobagens sexistas, nomeando-as e destacando-as. Por outro lado, é só mais um dia.
Dá aquela sensação estranha que devemos lembrar que 51% dos humanos no planeta são do sexo feminino. E quanto aos outros 364 dias?
A Vergonha é um Motivador Poderoso e Ainda Assim Fugaz
Você se lembra daquele momento que você ficou todo animado para falar sobre diversidade na tecnologia? Você se lembra de como planejou montar em seu cavalo e salvar todas nós? A insinuação de que a diversidade é um problema com uma solução clara, que o resto de nós simplesmente não foi suficientemente inteligente para detectar. Quer dizer, até você chegar no cavalo…
Lembro-me de quando você falou a coisa errada no evento da empresa. Sua equipe reclamou que você estava por fora. Você me escreveu envergonhado, quase num motim interno. Você disse que estava falando sério, que queria fazer mudanças e ser um aliado melhor.
Você me disse que não se opunha a mais mulheres ou minorias no setor da tecnologia. Você pensou que tudo estava ótimo. Você achou que as pessoas que chamaram sua atenção por falar besteira, estavam sendo excessivamente ásperas. Muito injusto.
Você pediu conselhos sobre como apoiar uma maior diversidade na tecnologia.
Eu fiz cara feia.
Trabalhar de graça para educar pessoas que já gozam de um grande privilégio é parte do problema. Parece a mesma coisa que apoiar o sistema que criou essa falta de diversidade.
Mas tudo bem. Eu me importo com essas coisas. Eu mordi minha língua. Eu dei uma limpada nos meus links favoritos para pessoas que querem ler sobre diversidade. Eu os enviei e me prontifiquei a entrar em contato novamente se você tivesse perguntas.
E você, neste momento de arrependimento ansioso, expressou gratidão e disse que obviamente ficaria em contato.
Só que você não ficou. Ainda não entrou em contato. E nem vai fazê-lo.
Não porque você não tenha começado com boas intenções. Não exatamente porque você não se importa com diversidade. É só que você ficou muito ocupado. E o seu calendário está cheio. E o trabalho de diversidade é de alguma forma diferente do trabalho normal.
E é assim que o patriarcado vence.
Diversidade Não é Uma Atividade Extracurricular
Para muitos startups, os esforços de diversidade são como esportes intramuros – a participação é opcional e se você furar, não é um grande problema. E do mesmo jeito que você planejava entrar para a equipe de Frisbee, mas acabou não entrando, abandonar o trabalho de diversidade não afeta a sua pontuação. Pelo menos não de maneiras que você possa ver agora.
Então, vamos falar sobre aquelas coisas que você não consegue ver.
Vamos falar sobre esse absurdo problema da suposta falta de talentos (“the pipeline problem”). Sobre como não há pessoas pertencentes a minorias em número suficiente se candidatando para certas funções. Ou pessoas suficientes que vem de dentro da própria empresa que se qualificam para promoções baseadas em mérito.
Vamos falar sobre casos concretos de abuso em empresas como o Uber. Novamente? Sim, novamente. E depois vamos dar uma olhada na discussão ocorrida no festival SXSW onde nos perguntamos em voz alta, como isso continua acontecendo.
Vamos falar sobre o maior problema que ninguém quer ver. Aquele no qual aceitamos um sistema quebrado e fodido, e pedimos às mulheres e pessoas de cor que aguentem firme. E então nós o aumentamos. Não através de um pequeno grupo de caras misóginos que querem falar sobre a programadora com uma bunda linda. Mas sim pela complacência de pessoas que, de outra forma, jurariam a torto e a direita sobre como elas estão fazendo o mundo um lugar melhor. O quanto eles adorariam ajudar a causa, dobrar as mangas e trabalhar.
Se ao menos eles tivessem tempo.
Como Você Usa Seu Tempo é Como Você Prioriza
Se você ou a sua organização não conseguem encontrar o tempo para o trabalho de diversidade, então esse trabalho não é importante para você. Não é porque você não está empolgadaço, mas sim super ocupado.
Se você deixar de participar por causa de um trabalho mais interessante, mais urgente ou que imponha mais pressão, você não se preocupa com a diversidade. E é somente a partir de uma posição privilegiada que se pode despriorizar a correção de um sistema desigual.
Se você diz que quer ajudar e depois não o faz, isso é pior do que não demonstrar interesse. Não finja interesse e paixão quando chamado, se for para perder o foco mais tarde.
Se você se importa, você precisa se importar o tempo todo. Não só nos feriados. Não quando você faz merda e alguém percebe. E não quando você contrata seu primeiro sócio do sexo feminino. O. Tempo. Todo.
Diversidade e inclusão são trabalhos árduos. É um trabalho cansativo. E, muitas vezes, é um trabalho ingrato. As pessoas que fazem isso todo dia são desproporcionalmente prejudicadas pela nossa falta coletiva de progresso.
Eu já escrevi antes sobre minhas próprias falhas nesse meio. Meu coeditor também. Nós conversamos aberta e dolorosamente sobre esses momentos em que nós cometemos erros. Nós nos abrimos para o mundo, embora fosse embaraçoso.
Possuir seu próprio privilégio não acontece do dia para a noite. Fazer uma cagada pode ser um primeiro passo poderoso para realizar mudanças.
Mas somente se você persistir.