Hoje é dia do índio, criado em homenagem ao primeiro Congresso Indigenista Interamericano, ocorrido em 1940, e que contou com a participação de diversas autoridades governamentais de países da América.
Naquele primeiro evento, os líderes indígenas não compareceram. Tinham receio devido às perseguições e agressões que sofriam dos “homens brancos” na época. No entanto, com o tempo, a participação indígena nesta data e nas discussões referentes ao futuro de seus povos, foi se tornando maior. O que está longe de significar que o tema deixou de ser pensado segundo uma ótica preconceituosa e cheia de desconhecimento.
Dizem que o dia do índio é uma data dedicada à reflexão sobre a importância da preservação dos povos indígenas, da manutenção de suas terras e respeito às suas manifestações culturais. Nas escolas os alunos fazem pesquisas sobre o assunto, os museus fazem exposições e diversos eventos em comemoração a esta data são realizados em todo o País. No entanto, se arriscarmos perguntar pelas ruas o que vem sendo feito pelos povos indígenas, pouco se sabe.
Por que a sociedade civil no Brasil não tem sido convidada a refletir sobre esse assunto? Será que o que os livros nos ensinam nas escolas não trazem uma narrativa eurocentrada, parcial e distante do universo indígena?
O Infame falou com o Bruno Weis, responsável pela estratégia de Comunicação do ISA, Instituto Socioambiental, que recentemente lançou a campanha #MenosPreconceitoMaisIndio.
Atuando há mais de 20 anos, o ISA é considerado uma das maiores referências em defesa dos direitos dos índios e valorização da cultura indígena. Nasceu do Centro Ecumênico de Informação e Documentação (CEDI), entidade criada nos anos 70 por antropólogos e profissionais de outras áreas para, nas palavras de Bruno, “colocar o índio no mapa” do Brasil.
O CEDI atuava em torno de uma contra-narrativa ao discurso militar da época, que pregava a ocupação da Amazônia como forma de proteção contra ameaças estrangeiras. Segundo o discurso governamental, tais regiões estavam “desocupadas”, algo que a entidade resolveu contestar.
Com o advento da Constituição Federal de 1988, depois de um trabalho longo de conscientização de congressistas, o ordenamento jurídico brasileiro passou a garantir diversos direitos ao índio. Pouco tempo depois, com a ECO 92, nasce o ambientalismo moderno e, diante dessas mudanças estruturais e conjunturais, decide-se pela criação do ISA, como forma de defender aqueles interesses assegurados pela legislação.
A organização mudou, recentemente, a sua estratégia de comunicação: deixou de falar apenas com parceiros e representes locais de seus programas e órgãos que financiam seus programas (como a Cooperação Internacional, fundações e fundos internacionais, como o Governo da Noruega, a União Européia, Fundação Ford, etc.), passando a dialogar diretamente com a sociedade em geral.
A partir de 2013, foi feito um planejamento estratégico até o ano de 2020. Nesse estudo, diante de mudanças políticas e internacionais, detectou-se que não seria mais possível manter o ISA incidindo politicamente como ele deveria incidir. Algo precisava ser feito. Um paradigma precisava ser quebrado. Com a escassez de recursos provenientes dessas fontes, o ISA passou então a concentrar seus esforços também na sociedade civil.
Já como resultado dessa nova fase, a campanha #MenosPreconeitoMaisIndio foi criada. Segundo Jurandir Craveiro, presidente do Conselho Diretor do ISA: “O insight do preconceito expõe uma questão pouco admitida no Brasil, que é o racismo contra os índios”.
A preocupação em expressar o olhar do índio na comunicação era grande. Segundo Bruno: “A preocupação maior por trás do projeto não era focar naquilo que o ISA achava mais importante. Não. O foco estava naquilo que mais incomodava a eles. Os índios”. O intuito era, portanto, abordar algo que eles sentiam na pele diariamente. Não queriam falar sobre o ISA e o que ele faz, mas sim passar um recado político que atendesse aos interesses dos seus parceiros, os povos da floresta.
Desse modo, o filme traz um trecho de uma entrevista com um velho líder Baniwa, uma reflexão que resume sobretudo um desafio atual para os mais de 250 povos indígenas existentes no Brasil: enfrentar o racismo e o preconceito que sofrem por terem incorporado hábitos e tecnologias não-indígenas ao seu dia a dia. Como se, para terem suas identidades e seus direitos respeitados, precisassem viver parados no tempo, em um museu.
“Estamos felizes de poder ajudar a combater o preconceito que sofremos e que sabemos que parentes nossos em várias partes do País também sofrem, muitas vezes com violência”, diz André Baniwa, uma das principais lideranças da etnia que protagoniza a campanha. “Diante de séculos de contato com os brancos, os Baniwa são um exemplo de resistência cultural”, reforça Beto Ricardo, coordenador do Programa Rio Negro, do ISA.
“O grande desafio é sair de uma certa bolha digital que nos deixa falando sempre com os mesmos. Imagino que a gente tenha chegado ao limite dessa bolha com essa campanha na internet. Também estamos trabalhando pra chegar a mais pessoas. E os índios, sobretudo, estão gostando muito”, afirmou Bruno.