“Parece que ali há 1,5 habitantes por quilómetro quadrado”, disse Claudia Proushan, pintora e fotografa que assina este ensaio voltado às suas viagens para a Mongolia.
“O espaço. O que mais que impressionou foi o espaço”. Falou e ficou em silêncio por alguns segundos, como se estivesse de volta ao seu destino asiático de alguns anos antes, olhando para os lados e para todo aquele espaço vazio em busca de gente que lhe contasse mais a respeito de um lugar tão peculiar.
Claudia conhece bem o continente. Já estivera antes em outros lugares por lá, viagens das quais destacou o Nepal, o Tibet (para onde foi 4 vezes) e a Galileia. Esses dois últimos destinos, inclusive, deram origem a seus dois livros fotográficos: “Tibet, no Coração do Himalaia” e “As Luzes da Galileia”. Em breve nasce o terceiro, destinado somente à Mongolia, destino para o qual já se somam 3 viagens.
Dentre todos os aspectos culturais que a poderiam atrair tanto para o lado oriental do globo, ela coloca o budismo tibetano em primeiro lugar. A filosofia por trás da crença, “aquela calmaria toda”. E, como era de se esperar de uma fotografa, o apelo estético dos costumes atrelados a tais crenças.
Conduzidos por um lama tibetano Gangchen, seu grupo conheceu diversos lugares do país. “Também passamos por cidades grandes, não muito diferentes das demais cidades grandes que vemos por aí. Tudo muito novo. E eu não estava lá pelo novo”.
Gostou mesmo do que viu no campo, aquele campo praticamente vazio, o campo da calmaria, que se recusava a dar respostas faladas pela falta de gente para responder algo, preferindo soprá-las nos silêncios que ocupavam o lugar. “No campo eles eram nômades, viviam em tendas, mudavam quando mudavam as estações. Desmontavam a tenda e pronto, seguiam em frente”, disse com entusiasmo, quase a ponto de a gente sentir uma ênfase ao seguir em frente.
Frisou também a relação deles com os animais, especialmente os cavalos, uma ligação antiga que vem desde a época do grande império mongol, iniciado no reinado de Gengis Khan, o maior império contíguo da História. O domínio sobre os cavalos sempre fora uma das principais armas para a sua construção. “Não é que era um meio de transporte. Era mais. Era uma coisa só: homem e cavalo juntos, como uma coisa única, indivisível. Não saiam nunca de cima deles”. “Não me esqueço de um homem que até me convidou para subir no animal dele. Ele estava sentado e a certa altura deu um beijo na boca do cavalo. Era uma relação diferente”. “Ah, e tinha o leite de égua, que eles ofereciam como uma iguaria, todo felizes, meio como se fosse um vinho dos caros”.
“Curioso mesmo era uma senhora que nos visitava todos os dias. E não falava uma palavra em inglês. Ela aparecia, sentava do meu lado e ficava lá, rezando numa espécie de “rosário””, obviamente se referindo a uma versão tibetana do tradicional instrumento católico. A senhora os acompanhava em todas as visitas e passeios. “Ao final a senhora até me deu uma roupinha de seda, para crianças. Hoje quem usa é a minha sobrinha”, falou sorrindo e com gratidão. Claudia achou estranho no começo, mas depois se acostumou: “Estava tudo bem. Ela era uma amiga. Não falávamos, mas era uma amiga”, completou satisfeita, como se estivesse falando de alguém com quem trocara horas de conversas ao longo de anos. Algo que nos faz questionar o conceito de conversa, de comunicação. Dependendo de como olharmos, talvez tenham sim conversado bastante, por meio de olhares combinados com os silêncios de suas falas, espalhados pelos quilômetros e quilômetros preenchidos com, ao que dizem, somente 1,5 habitantes.