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Jardim da Luz: Na Bunda do Capão Redondo

Por Diogo Moreira |  28 de fevereiro de 2017

Há anos que o Capão Redondo, bairro da zona sul de São Paulo, é um símbolo da violência na cidade. Não é que faltem outros bairros marginalizados e esquecidos pelas autoridades, nos quais cometer um crime não seja tão arriscado quanto cometê-lo nos Jardins ou no Itaim Bibi. Não é isso não. Não falta buraco quente em São Paulo. A questão é que, por algum motivo, o Capão acabou ganhando mais notoriedade. Se fosse para arriscar um palpite, talvez pudéssemos fazer um link com o sucesso dos Racionais MC’s nos anos 90, grupo de rap que há anos é uma espécie de porta-voz daquela região. Talvez, difícil de saber.

Na frente do Capão está o Parque Santo Antônio, a Chácara Santana, o Jardim das Flores, a Vila Socorro e mais adiante, ali depois do rio e em direção à civilização dos crimes menos impunes, Santo Amaro.

Estar à frente do Capão é uma benção. Pode parecer só uma questão geográfica, de importância relativa, mas quanto mais perto da região central, menos chance de você ser esquecido como bairro. Confira as estatísticas e, com algumas exceções, esses dados gritarão para que sejam ouvidos.

Bom, agora pensa só: se já é difícil ser um bairro que está no nariz do Capão, imagina para quem está na bunda do Capão…

Pois bem, o Jardim da Luz, no Embú das Artes, está ali, bem na bunda do Capão Redondo, apropriando-se de todo o simbolismo de ser um esquecido entre os esquecidos.

Diogo Moreira, o fotógrafo que assina este ensaio, tem uma relação antiga com o bairro, por conta de um projeto voluntário em que ele ajudava crianças carentes da região, levando-as para o centro do Embú, onde visitariam teatros ou fariam outros passeios de cunho cultural. Para algumas dessas crianças, era o primeiro convite a refletir sobre essa palavra meio ensimesmada: a tal da “arte”.

Desde então o Diogo desenvolveu um carinho por aquele lugar e um certo dia resolveu levar sua máquina fotográfica para registrá-lo. Registrar dias comuns, a vida daquelas pessoas por quem se afeiçoou. Foi sem planejamento, entrando nas casas em que era convidado a entrar, na cara de pau, pedindo licença e aperto o click.

Quando perguntado sobre o porquê desse ensaio, uma resposta quase óbvia: queria dar voz àquelas pessoas. Em outras palavras, talvez quisesse ser o Racionais do Jardim da Luz, lugar de gente simpática e que costuma abrir suas portas a quem peça licença. Talvez, difícil de dizer. O trabalho não pode ignorar as dificuldades estruturais do bairro, sua pobreza e os sofrimentos dos seus moradores, mas revela também a beleza peculiar daquele cotidiano esquecido por muita gente bem no meio da bunda do Capão.

 

 

Curadoria e Entrevista: Equipe Infame

Diogo Moreira

Diogo Moreira

Em 2011, Diogo Moreira pediu as contas no escritório de advocacia em que trabalhava havia onze anos para se dedicar ao fotojornalismo. Muitos acharam que ele estava maluco, mas seguiu seus instintos, trabalhou nas grandes agências de fotojornalismo do país e no jornal Diário de S. Paulo. Atualmente trabalha para o Governo do Estado de São Paulo. Diz sorrindo que a fotografia mudou a sua história de vida e o levou para lugares que não conhecia.